Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2009 Lisa Chaplin. Todos os direitos reservados.

DE REPENTE… PRÍNCIPE, N.º 1315 - Fevereiro 2012

Título original: The Rebel King

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em portugués em 2012

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

® Harlequin, logotipo Harlequin e Bianca são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

I.S.B.N.: 978-84-9010-671-6

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

Prólogo

Sidney, Austrália

Quando o camião de bombeiros travou junto da calçada, o andar de baixo da casa foi engolido pelas chamas. A sirene ouvia-se por cima dos gritos das pessoas aterrorizadas que corriam de um lado para o outro. O céu da noite estava iluminado e os adornos de Natal das janelas tinham-se transformado em chamas.

«Assim é o trabalho.» Charlie Costa aceitava-o como fizera durante anos. Guardaria as suas emoções para mais tarde.

– Winder, Costa, preparem-se e entrem – gritou Leopard, o capitão, para Charlie e para o seu colega, Toby. – Procurem qualquer vestígio de vida. Os outros podem começar a molhar a casa e o jardim e vigiem essas árvores. Temos de evitar que o monstro salte para as casas próximas.

«O monstro» era o nome que os bombeiros davam ao inimigo. Charlie ainda recordava o calafrio que o percorrera da primeira vez que o ouvira. Agora era um grito de guerra contra o inimigo faminto destruidor de um bombeiro.

– Analisa os teus problemas mais tarde, Charlie –disse alguém. – Agora é o Grande Destruidor que enfrentamos.

– Como queira, senhor – Charlie sorriu para Toby Winder, o seu melhor amigo e um metro e noventa e cinco de músculo. Era aquela camaradagem que os ajudava a acalmar a tensão do momento. – Vamos lá – Charlie pôs a máscara e o equipamento de sobrevivência. Cobertos pelos rapazes que atiravam água sobre eles, Toby e ele entraram na casa através do que restava da porta. Os outros fechariam as janelas que estivessem abertas e cobririam os vidros que já se tinham partido. Quanto menos oxigénio houvesse ali dentro, mais probabilidades teriam de encontrar sobreviventes naquele inferno, pois, segundo os tinham informado, havia uma jovem família presa lá dentro.

– O fogo começou na cozinha – disse Toby pelo rádio, ao entrar no vestíbulo cheio de fumo. – Não devem ter desligado o forno. O fogo espalhou-se para o segundo andar antes de se espalhar para aqui – agora não estava a usar as suas palavras favoritas, estava demasiado preocupado. – Irei lá acima e Charlie ficará aqui em baixo.

– Não! – gritou Charlie, seguindo Toby pelas escadas. – Se havia alguém aqui em baixo, já deve ter saído. Subiremos juntos e procuraremos primeiro as crianças e depois os pais.

O que não disse era que, se fossem juntos, tinham mais probabilidades de sobreviver. Com o risco de o chão cair sob o peso de Toby, Charlie não deixaria o seu amigo subir sozinho. Por alguma razão que nunca entenderia, o facto de estar lá para equilibrar o peso costumava fazer com que o chão aguentasse um pouco mais.

Encontraram a primeira pessoa deitada no patamar da escada. Uma mulher, supostamente a mãe, com os braços esticados para o andar superior. Toby fez uma análise rápida do seu estado.

– Chamem os paramédicos. Não respira, o seu pulso é fraco. Estamos a perdê-la.

Charlie encheu as escadas e a carpete que chegava até à porta com retardador de fogo e desviou todos os móveis que podiam arder. Toby desligou o ar da sua máscara e começou com a respiração artificial. Não podiam arriscar-se a dar oxigénio à mulher até todos terem saído dali e estarem a salvo. E ela preferiria isso do que sobreviver e deixar os seus filhos morrer na explosão inevitável que aconteceria.

Ouviram um forte rangido enquanto uma maca levava a mulher.

– O telhado está a cair!

Como se fossem um, ambos subiram as escadas a correr.

– Mandem mais dois homens para nos darem um pouco de tempo! – gritou Charlie, por rádio.

– Saiam! É uma ordem! Vai cair! – gritou o seu capitão.

Mas nenhum dos dois lhe prestou atenção. Toby entrou na primeira divisão à esquerda e Charlie ouviu-o gritar:

– Escadas nas janelas das divisões de cima!

Resignado, o capitão deu a ordem. Todos sabiam que eles nunca saíam de um edifício antes de encontrarem o último dos sobreviventes. A sua maneira de trabalhar era espantosa e, conhecendo-se tão bem um ao outro, com o amor fraternal que sentiam e com o facto de serem capazes de ler a mente um do outro, faziam a melhor equipa possível.

Charlie percorreu o chão do corredor. Ia cair. Saltou de um lado para o outro, caindo junto das paredes, onde o chão seria mais forte, para chegar até uma divisão no fundo da casa.

Abriu a porta e fechou-a para cortar a passagem do oxigénio. Ao fim de trinta segundos, o interior da sala começou a ganhar forma através da nuvem de fumo e conseguiu ver umas paredes brancas, uma cama cor-de-rosa e uma casa de bonecas. Gritou:

– Há alguém aqui?

Mesmo entre os barulhos do monstro, os seus ouvidos treinados ouviram uma tosse diminuta.

Fechou o ar da máscara e tirou-a. A máscara e o uniforme costumavam assustar as crianças.

– Olá, querida, o meu nome é Charlie. Sou um bombeiro – tossiu por causa do fumo que encheu os seus pulmões e a sua garganta numa questão de segundos. – Queres ir ter com a mamã?

Ouviu outra tosse que saía de baixo da cama, onde havia uma menina de cerca de três anos.

– Não há problema, querida. Já estou aqui. Escada no quarto do fundo, no extremo esquerdo! Tenho uma menina!

– Quarenta e cinco segundos! – gritou Leopard.

Depois de pôr a máscara para respirar, fez-lhe um exame rápido à menina. Deixaria de respirar a qualquer momento. Atou-lhe uma corda e pegou nela ao colo.

Tinha de seguir a regra essencial: «nunca tires a máscara para a dar a uma vítima porque não poderás salvar ninguém se estiveres morto ou inconsciente.» Se o fizesse, não só arriscaria a sua vida, como também a da sua equipa, que teria de entrar para o salvar, e a da menina, se lhe acontecesse alguma coisa. Mas era quase um bebé. Ele já tivera uma vida… E a dela acabara de começar.

Esperando que não houvesse faíscas no quarto que pudessem alimentar-se do oxigénio, tirou a máscara e pô-la sobre a cara da menina, ajustando a saída de ar, já que muito oxigénio naquele momento podia ser prejudicial, se inalara o fumo. Depois, sustendo a respiração, virou-se para sair pela porta, mas sentiu uma explosão por baixo dele. O chão curvou-se por baixo do seu pé esquerdo.

– Preciso de uma escada! Tenho um menino inconsciente. Não respira! – ouviu Toby gritar. Estava claro que o seu amigo também não tinha máscara. Estavam a ficar sem tempo.

Charlie começou a sentir que lhe ardiam os pés através das botas.

– Vamos conseguir, querida. Os nossos rapazes são os melhores – ele tossiu. «Baixa-te para teres mais ar, idiota!» Mas se o fizesse, o chão cairia. Não podia arriscar-se a mexer-se, mas tinha de respirar ou poria as suas vidas em perigo. Viu a menina a respirar fundo, tirou-lhe a máscara, respirou e voltou a pôr-lha na cara.

Agora a única coisa que podia fazer era observar a respiração da menina, tirar-lhe a máscara, respirar e dar-lha novamente. Ouviu vidros a partir no quarto contíguo. O monstro aproximava-se.

Um sopro de ar limpo encheu o quarto e a porta rebentou quando o fogo entrou à procura de oxigénio. Alguém gritou:

– Dá-ma.

«Obrigado, meu Deus!» Charlie saltou para a cama, que estava junto da janela.

– Toma!

A cama afundou-se para um lado quando o chão caiu sob o seu peso. O calor estava a queimar-lhe as costas, era como se estivesse a derreter-lhe a pele…

Conseguia sentir o cheiro a queimado da sua pele.

– Salta!

Mal conseguir mexer-se. O calor, a dor e a falta de ar impediam-no. Agarrou-se com uma mão à janela.

– Está bem. Consigo fazê-lo. Levantarei um joelho…

A cama cambaleou e caiu por onde antes estivera o chão. O seu corpo foi para trás, mas os seus desesperados dedos continuavam agarrados à janela.

– Ajuda – sussurrou.

Umas mãos surgiram no meio da escuridão e tiraram-no dali.

– Já estás connosco – era Leopard. – Salvaste-a, Charlie. A pequena vai viver e tu também.

Charlie tossia. Respirar ar fresco fazia-lhe mal.

– E Toby?

– Está bem. Salvou o menino. Fizemos tudo o que pudemos. Vamos!

As palavras do capitão disseram-lhe que alguém tinha morrido.

Não… Aquelas pobres crianças tinham perdido a sua mãe.

Enquanto o punham a salvo, sentiu os flashes das máquinas fotográficas e ouviu as palavras «herói» e «salvar as vidas de uma família», mas sentia que não podia receber elogios por ter cumprido com o seu dever. Caiu de joelhos, tossiu e vomitou.

Em minutos, os paramédicos puseram-no numa maca e levaram-no para o hospital. Ficou inconsciente enquanto pensava que, apesar de ter feito tudo o que pudera, uma mulher morrera e duas crianças tinham perdido a sua mãe e isso, para ele, significava que não fizera o suficiente.

Capítulo 1

Sidney, três meses depois

– Sou o grão quê? – Charlie sorriu para o advogado no escritório revestido em carvalho do centro de Sidney. – Sim, claro, e que mais? Agora a sério, porque estamos aqui?

A sua irmã deu-lhe a mão.

– Penso que fala a sério, Charlie.

Face ao tom de voz de Lia, o instinto de proteção de Charlie aumentou. Lia estava pálida e conseguia sentir como lhe tremia a mão.

Não podia culpá-la. Aquela notícia podia destruir a sua irmã. Depois de tantos anos de progresso, podia voltar a cair na anorexia face ao impacto causado por aquela notícia.

– Vá lá, senhor Damianakis. Diga-nos porque estamos aqui. Está a assustar a minha irmã.

O advogado sorriu para Lia a modo de desculpa, mas as suas palavras não aliviaram Charlie.

– Sei que isto pode ser um grande choque para os dois. Para nós, também foi uma surpresa. O consulado contactou connosco depois de se conhecer a história de como resgatou as crianças da casa em chamas. Tinham enviado fotografias dos seus avós para todos os consulados do mundo. É a imagem viva do seu avô. A fotografia em que aparece a aceitar a medalha deu azo a uma investigação que demonstra que os papéis que o seu avô usou para entrar na Austrália não eram legais. Os relatórios gregos mostraram que o autêntico Kyriacou Charles Konstantinos, que partilhava data de nascimento com o seu avô, morreu no Chipre oito meses antes de o seu avô chegar a Sidney em 1941, utilizando os mesmos papéis.

– Isso só demonstra que Papou era um cidadão ilegal – era uma coisa que Charlie sempre suspeitara do seu avô, um homem que trabalhava por conta própria e que preferia receber a dinheiro sempre que podia.

Apercebeu-se naquele instante de que Papou construíra e pagara a casa e tudo o que havia dentro dela com dinheiro… Sendo o filho de um humilde pedreiro e tendo-se dedicado unicamente à carpintaria. De onde saíra todo o dinheiro?

– Não, não demonstra nada… Mas foi um começo. O nome do seu pai é o da família Marandis: Athanasius, como o seu bisavô, o grão-duque. Os relatórios médicos do seu avô refletiam certas anomalias familiares, como o dedo mindinho da mão direita torcido, o grupo sanguíneo AB negativo, que é habitual na linha masculina helénica, mas raro entre os cipriotas e que não existe na família Konstantinos.

Lia apertou com mais força a mão de Charlie e ele não soube o que fazer para a tranquilizar. Oxalá Toby estivesse ali!

– E a origem italiana da sua avó foi a chave de tudo. Quando entrámos em contacto com a sua família de Milão, enviaram-nos fotografias dela quando era jovem e vimos que eram muito parecidas, menina Costa, soubemos que não estávamos enganados.

Charlie tocou na pele dorida do pescoço, onde chegara o calor do fogo através do seu uniforme de bombeiro. Depois daquilo, a imprensa seguira-o durante dias, tentando transformá-lo num herói. Tinham-nos seguido a Toby e a ele quando foram visitar as crianças ao hospital e tentaram consolar o pai que perdera a sua esposa.

Bolas! Aquelas crianças tinham perdido a sua mãe porque ele não conseguira salvá-la. Se não fosse porque a imprensa o transformara numa coisa que não era, ainda estaria a viver numa escuridão feliz.

Levantou-se, levantando Lia com ele.

– Isto tem de ser uma brincadeira. Tem trinta segundos para nos dizer a verdadeira razão por que estamos aqui antes de sairmos por aquela porta.

– Senhor, falo totalmente a sério – o senhor Damianakis entregou-lhe um documento e uma fotografia. – Aqui tem a certidão de nascimento do falecido grão-duque e a fotografia que tiraram quando se tornou maior de idade.

Charlie olhou para ela. Não havia dúvida de que era Papou, o mesmo que sempre odiara a guerra e que, na imagem, aparecia vestido com um uniforme militar e coberto de medalhas sobre uma legenda que dizia:

1939. O marquês de Junoar, com dezoito anos, na sua graduação da Academia Militar Helénica com os seus pais, o grão-duque e a Duquesa de Malascos.

A certidão de nascimento dizia:

Kyriacou Charles Marandis, filho de sua Excelência, o grão-duque de Malascos e da Grã-duquesa Helena Marandis, antes lady Helena Doughtrym, filha do duque de…

As palavras apagaram-se à frente dele à medida que a sua cabeça dava voltas. A data de nascimento era a mesma, a cara era exata e o nome era Kyriacou Charles. Era o seu nome e o do seu avô, segundo a tradição, tal como Lia era Giulia Maria, como a sua avó.

Se tudo aquilo era verdade, a sua avó tímida e retraída fora a neta de um conde, uma mulher sem título por quem Papou deixara tudo e com quem fugira para se casar.

Mas… como podia descender de duques e condes?

– E quando aparece o homem da máscara de ferro e os três mosqueteiros? – perguntou Charles, com ironia na voz.

– Pode parecer incrível: um duque que foge com a sua amada, os príncipes perdidos… Uma grande fortuna.

Lia lera as palavras escritas na legenda da fotografia e disse, gaguejando:

– Não pode tratar-se de Papou. Estão enganados. O nosso sobrenome é Costa. Somos gregos.

– O seu avô adotou o sobrenome e a nacionalidade que lhe deu o homem que lhe criou a sua identidade falsa e mudou Konstantinos por uma versão mais simples, Costa. Provavelmente, para evitar o escrutínio da imprensa e que o seguissem por todo o mundo. Mas não há dúvida. Tornou-se grão-duque de Malascos quando o seu pai morreu e o senhor tornou-se no marquês de Junoar quando o seu pai morreu. Dadas as tragédias acontecidas na nação durante a última década, já não é simplesmente o marquês de Junoar ou o grão-duque de Malascos.

– Simplesmente? – perguntou Charles, com incredulidade.

– Segundo a lei helénica, como último varão na linha direta, é o príncipe herdeiro do trono. E a menina… – disse, sorrindo para Lia, – é Sua Alteza Real Giulia Marandis, princesa de Hellenia. O seu bisavô deixou uma grande fortuna privada para os seus descendentes perdidos de cerca de quinhentos milhões de euros em terras, ouro e contas bancárias. Penso que queria que o seu filho soubesse que o perdoara –e acrescentou rapidamente, ao ver que Lia estava pálida: – Por favor, sente-se, Sua Alteza.

Lia soltou a mão de Charlie e deixou-se cair na cadeira.

– Não me chame assim – disse, horrorizada.

Charlie sentia-se confuso. Dirigiu-se para a janela, viu a limusina com bandeiras diplomáticas e cerrou os punhos. O conto de fadas de que queria rir-se estava a transformar-se numa realidade horrível.

– Disse que o meu bisavô deserdou Papou quando se casou com Yiayia. Mas então, o que querem de nós?

– Quando o seu avô foi deserdado, era o nono na linha de sucessão ao trono, mas havia outros vinte membros diretos da família Marandis que podiam herdar. Os últimos trinta anos foram uma época de tragédias na Hellenia. Um golpe de estado matou vários membros da sua família. Há doze anos, os rebeldes insurgiram-se a favor de um homem chamado Orakis que reclamava o trono e assim começou a guerra civil que durou uma década. Morreram milhares de pessoas e muitas cidades e aldeias ficaram destruídas.

– Se esse tal Orakis quer o trono, pode ficar com ele. Assim mais ninguém terá de morrer.

– Charlie – disse Lia. – O senhor Damianakis não tem culpa de nada.

– Lamento – balbuciou. – Continue.

– Há apenas dois anos, o príncipe e o seu filho contraíram meningite e morreram com poucos dias de diferença, deixando a princesa Jazmine sozinha na linha de sucessão. As leis da Hellenia não permitem que uma mulher herde o trono se houver varões Marandis. O grão-duque de Falcandis é um descendente, mas por parte de mãe. O rei Angelis começou a procurar o seu primo, o grão-duque de Malascos e os seus descendentes. Se quiserem mais provas, há uma limusina à espera lá fora para vos levar ao jato privado que se encontra no aeroporto de Kingsford-Smith. Levar-vos-á à Embaixada da Hellenia em Camberra. Um representante da família real está à espera para vos responder a qualquer pergunta que tenham e para vos dar os papéis de que precisam para ir para a Hellenia imediatamente. Sua Majestade o rei da Hellenia, tal como a sua Alteza Real Jazmine e o grão-duque de Falcandis, esperam pela vossa chegada.

Enquanto o advogado dizia mais alguma coisa, a mente de Charlie vagueava. Abanou a cabeça, tentando esclarecer as ideias, acordar e descobrir que fora um sonho. Havia vezes em que nem sequer se sentia qualificado para ser bombeiro e agora era um… Era um…

– Charlie…

Virou-se para ver as faces da sua irmã com aquele tom pálido.

– Lia? – correu para ela e baixou-se junto da sua cadeira para medir os seus sinais vitais. – O que lhe disse?

– Não me ouviu? – perguntou o homem, nervoso.

– Se fosse assim, não lhe perguntaria. Diga-me porque está Lia assim.

– Disse que tinham de se preparar. O embaixador pensa que é melhor contar-lho aqui, num ambiente mais tranquilo – tentando reunir a coragem suficiente, olhou para Charlie. – Sua Majestade, o rei Angelis, marcou casamentos reais para ambos e quer que se celebrem o mais depressa possível.

Cidade de Orakidis, Hellenia

Na manhã seguinte

O bonito Rolls Royce preto parou à frente do palácio de verão onde o rei estava a residir até o palácio principal estar totalmente restaurado depois do incêndio que acontecera durante um ataque há anos.

Ainda havia muito para reparar nas cidades, nas casas e nas aldeias do país e a família real não podia dar importância à restauração de um palácio.

O coração de Jazmine estava acelerado enquanto esperava junto de Max ao fundo das escadas, cento e vinte centímetros atrás do rei, como exigia o protocolo real. Como princesa e duque, tinham uma posição que o mundo invejaria e, no entanto, ali estavam outra vez, duas marionetas do rei que agiam conforme o seu desejo. Eram velhos amigos e tinham estado noivos um do outro até há um mês. Agora estavam noivos de estranhos.

– Coragem – sussurrou-lhe o grão-duque ao ouvido.

– Este é o meu dever, não preciso de coragem para enfrentar uma coisa que não posso mudar.

– Tens razão, a resignação seria mais útil no nosso caso – disse ele, num tom divertido. Ela não respondeu. – Diz alguma coisa, Jazmine.

Ela sentiu um ligeiro calor nas faces. O seu avô, o rei, dissolvera o seu noivado quando se confirmara a notícia da existência do príncipe Kyriacou. A secretária de imprensa do rei dissera que uma amizade que vinha desde a infância podia fazer com que o noivado parecesse um pouco estranho e o rei aproveitara esse comentário porque lhe convinha.

Jazmine sorriu para aquela bonita cara. Sentira-se tão envergonhada com a conduta do seu avô que não fora capaz de olhar para Max nos olhos até àquele momento.

– Tens razão, Max. Obrigada.

– Aqui vêm os nossos futuros companheiros –murmurou ele, sorrindo com o afeto que tinham partilhado desde que tinham treze anos. – Os nossos primos.

«Graças a Deus», pensou Jazmine. A ideia de se casar com um parente parecera-lhe repugnante, mas o facto de o avô do príncipe Kyriacou se ter casado com a neta de um conde italiano e de o seu pai ter casado com uma mulher grega, uma verdadeira plebeia, desbotara a linha de sangue.

Ficou quieta quando os trompetistas começaram a entoar o hino nacional da Hellenia. Na nossa coragem nos apoiamos, para receber a realeza.

Uma jovem mulher foi a primeira a aparecer, vestida com a saia e a blusa de seda que Jazmine escolhera. Sem dúvida, tratava-se de Giulia.