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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2001 Lori Foster

© 2015 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Demasiado próximo, n.º 82 - Julho 2015

Título original: Caught in the Act

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

Publicado em português em 2005

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), acontecimentos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Internacional e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-7180-9

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S. L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Um

Dois

Três

Quatro

Cinco

Seis

Sete

Oito

Nove

Dez

Onze

Doze

Treze

Catorze

Se gostou deste livro…

Um

 

Embora a chuva batesse lentamente na janela, Mick Dawson ainda podia contemplar o exterior. Via como as pessoas formavam remoinhos com guarda-chuvas coloridos e chapéus sobre o passeio. Estava tão concentrado em localizá-la que só ouvia metade da conversa. No entanto, «metade» era precisamente o máximo que se requeria quando os seus amigos falavam daquele assunto em particular.

– Vês aquela loira tão bonita? – perguntou Josh Marshall. – A que acaba de entrar? Tem vestido um sutiã desses que levantam o peito.

– A sério? – perguntou Zach Grange com voz seca. – Como sabes?

– Conheço as mulheres – replicou Josh com certo cinismo, – e em especial, os seios das mulheres. Com a tua idade, eu teria jurado que tu também.

– Sim, e, com a tua idade, eu teria jurado que já te tinhas desfeito das obsessões de adolescente – replicou Zach.

Os três homens estavam sentados numa mesa do Marco’s, um restaurante italiano muito informal que tinham descoberto há cinco anos. Ficava próximo do local de trabalho dos três, no centro da cidade.

Iam ali com frequência e parecia que cada vez mais à medida que os anos passavam. De facto, reuniam-se quase todos os dias para almoçar e, com frequência, também jantavam ali. Nenhum dos três era casado. Josh era um solteiro empedernido, Zach era viúvo e Mick… Mick não tinha encontrado a mulher adequada. Os seus critérios eram muito estritos, mas, em sua opinião, o casamento era para sempre. Tinha visto com muita frequência casamentos tempestuosos, que se sustentavam graças à ironia, aos enganos e ao álcool. Também tinha sido testemunha do melhor, de uniões que gotejavam amor, confiança e apoio. Não pensava conformar-se com menos do que sabia que podia e devia ser.

Devido à disparidade dos seus trabalhos e à sua carência de laços afectivos com uma mulher, as suas reuniões no Marco’s eram a coisa mais próxima a uma rotina doméstica de que os três podiam gozar.

O restaurante servia como local de celebração e também de comiseração, como quando a esposa de Zach morrera e ele quisera afastar-se de tudo e não ver ninguém nem fazer nada excepto mimar a sua filhinha. Como quando Mick levara um tiro na perna e estivera várias semanas de baixa, algo que lhe provocara um profundo desassossego.

A vida de Mick estava cheia de escuridão, de ameaças e de cautela, à excepção de quando estava no Marco’s, com as pessoas em quem confiava. Os seus dois amigos. A sua família. Ninguém mais, pelo menos não no momento.

Nenhuma mulher lhe tinha chamado suficientemente a atenção para que existisse a possibilidade de construir algo mais sério. Pelo menos, até à data.

No entanto, naquele momento, sentia-se intrigado.

– Mick, diz a este imbecil que os seios de uma mulher não se erguem com o sol, como se fossem uma flor – disse-lhe Josh, a rir do seu próprio comentário, – se estiverem prestes a tocar-lhe no queixo. Garanto-te que leva um sutiã desses que os levantam.

Mick olhou para Zach e sorriu.

– Josh é um idiota no que se refere às mulheres, o que inclui o seu fascínio anormal pelos seios. Nisto estou de acordo contigo. Deveria tê-lo superado há já muitos anos.

– Os homens nunca superam o fascínio que sentem pelos seios de uma mulher – replicou Josh, a abanar a cabeça como se lhe desse pena escutar as palavras do seu amigo. – Vocês dois é que são muito estranhos.

– Uma mulher a sério fazia-te em picadinho – disse Mick.

– Uma mulher a sério? – perguntou Zach, a fingir confusão. – Queres dizer uma mulher que tenha um coeficiente intelectual maior que dez? E por que ia sair Josh com alguém mais inteligente que ele?

– Pois, pois – comentou Josh, com ironia e um sorriso nos lábios. – O que acontece é que estão com ciúmes. Além disso, as mulheres têm coisas melhores que fazer quando estão ao meu lado. E não me refiro ao picadinho – acrescentou. Os três puseram-se a rir. – Então, se não vos excitam os seios de uma mulher, que deveriam ser suaves e naturais e não apontar para o céu, o que é que vos excita?

– Não tivemos esta mesma conversa quando estávamos no liceu? – perguntou Mick.

– Sim, mas continua a ser interessante.

– A barriga – respondeu Zach, de repente.

– Como dizes? – quis saber Josh.

Mick, de momento, parecia satisfeito com limitar-se a escutar.

– Eu adoro a barriga de uma mulher – disse Zach, a sorrir. – Não tão musculada como a têm as raparigas hoje em dia, mas simplesmente a barriga suave e lisa de uma mulher. Sim, a mim parece-me muito sexy.

– Está bem – admitiu Josh, depois de reflectir durante uns instantes. – Tenho que te dar a razão. A barriga também está muito bem, mas eu não gosto dos piercings no umbigo.

– Eu também não – afirmou Zach. – Uma barriga bonita não necessita de decoração.

– E tu, Mick? – quis saber Josh. – Do que é que gostas? De pernas longas? De rabos de tirar o fôlego? De quê?

Mick deu outra dentada na sandes de bacon, alface e tomate que estava a comer, quase só para fazer alguma coisa, não porque tivesse fome. Pensou na reacção que tivera quando a vira pela primeira vez. Em que se fixara? O que lhe chamara a atenção e o mantivera interessado ao ponto de ficar praticamente obcecado?

Voltou a olhar pela janela. Era um dia de Julho triste, com vento, nublado e húmido. Ela devia estar prestes a chegar.

Fixara-se nela pela primeira vez no seu bairro. Fora arrendar o apartamento do último andar do edifício que ainda possuía, o mesmo no qual passara a sua infância. Aquele edifício guardava recordações muito desagradáveis para ele, mas também algumas muito especiais. Conservava-o para lembrar a si mesmo que as coisas tinham mudado, que ele tinha mudado, mas que nem por isso deixava de ser um produto dos anos da infância.

Evidentemente, ela vivia no edifício ao lado, porque descera a rua e dirigira-se aos correios com algumas cartas na mão. Aquilo preocupara-o, porque ninguém podia andar com tranquilidade sem protecção naquele bairro. Dizer que era perigoso seria um eufemismo.

No entanto, ela fora passear sem qualquer preocupação. Mick não hesitara em segui-la para se assegurar de que não lhe acontecia nada, apreciando o espectáculo que ela dava enquanto caminhava pelo passeio com segurança e quase com presunção.

Naquele dia fazia calor e o sol reflectia-se na sua cabeleira preta. O cabelo chegava-lhe aos ombros e tinha um aspecto tão sedoso que parecia flutuar com cada um dos seus movimentos. Os olhos azuis olhavam para tudo e para todos, incluindo para Mick, como se tudo o que visse fosse uma grande distracção para ela. Ele ficara deslumbrado pelo seu corpo alto e magro, pelas suas pernas altas e esbeltas e pelos seus ombros frágeis e largos. O mais estranho de tudo era que, quando ela regressara dos correios e passara ao seu lado, ele nem sequer se fixara nos seus seios. Toda a sua atenção estava concentrada no rosto daquela mulher, no queixo forte, no nariz direito e na cor pálida dos olhos.

Mick perguntou-se durante um instante o que pensaria Josh de não ter reparado neles.

Queria conhecê-la, queria ter relações sexuais com ela até que perdesse o conhecimento de puro esgotamento, mas nem por isso pensava falar dela com Josh nem com Zach. Por isso, simplesmente encolheu os ombros.

– Para mim, é a combinação de uma série de coisas. Além disso, é diferente com cada mulher.

Antes que Zach ou Josh pudessem fazer qualquer comentário à sua resposta, viu-a. Sem se dar conta, pousou a sandes sobre o prato e virou-se para a ver melhor através da janela. Apesar da chuva, do céu cinzento, tinha estado à espera dela. Um pouco de humidade não a obrigaria a ficar em casa. A ela, não. Saía para correr todos os dias mais ou menos à mesma hora, pelo mesmo lugar ou, pelo menos, era o que fazia há duas semanas. Parecia coisa do destino que a tivesse visto pela primeira vez na zona onde tinha o seu imóvel e depois ali, onde costumava reunir-se com os seus amigos.

Zach, como era bastante razoável, não se queixara quando Mick insistira em sentar-se ao lado da janela. Pelo contrário, Josh, entre gargalhadas e brincadeiras, pedira-lhe que confessasse o que queria ver. Mick negara-se, mas já não importava. No momento em que olhou pela janela, Josh percebeu o que estava a acontecer.

– Pois sim! Aí está, Zach. Penso que vamos ver passar a dama misteriosa a qualquer momento.

Rapidamente, os dois amigos viraram-se também e ficaram a olhar pela janela. A rua estava cheia de gente que ia e vinha de um lado para o outro. E ali estava ela, a contornar o tráfego humano enquanto corria, com a cabeça descoberta e roupas que eram muito mais adequadas para um dia de sol. O mais estranho é que passou justamente diante dos três amigos, com a trança a saltar de um lado para o outro e água a gotejar-lhe do nariz, mas nem Josh nem Zach se fixaram nela.

No entanto, Mick, sim, viu-a. Apesar de estar molhada e cansada, desejava-a. Sentiu os músculos esticarem-se, o sangue aquecer e a pele despertar com um formigueiro. Se só de a ver correr experimentava aquelas sensações, que sentiria se pudesse beijá-la, acariciá-la, deslizar dentro do seu corpo e escutar os gemidos de prazer que o orgasmo lhe arrancaria?

Imediatamente, sentiu uma erecção e murmurou uma maldição. Aquilo era uma loucura, mas não podia evitar. Para ocultar a sua reacção, inclinou-se sobre a mesa. Como ela já tinha passado, pôde voltar-se para Zach e Josh, que continuavam a examinar o passeio à procura da mulher escolhida pelo seu amigo. Mick aventurou um último olhar e notou que tinha o rabo bem firme sob os calções de ciclista justos. As suas mãos grandes cobri-lo-iam por completo e poderia mantê-la imóvel quando se afundasse nela uma e outra vez…

Josh interrompeu aquela interessante fantasia.

– E então? O que é que procuramos?

– Agora, nada – respondeu Mick, antes de tomar um gole de café.

Sabia que tinha que se controlar e consegui-la.

Talvez depois de ter feito amor com ela, durante não menos de dez dias, pudesse esquecê-la.

Com um gesto cómico no rosto, Josh inclinou-se diante de Zach e esteve prestes a atirar-lhe o prato ao chão. Então, apertou o nariz contra o vidro da janela. Olhou uma e outra vez e, por fim, disse:

– Maldita seja! Não há ninguém que valha a pena admirar!

Mick e Zach partilharam um olhar. Então, o segundo encolheu os ombros.

– Se só procuras seios, pode ser. Talvez Mick procure outra coisa.

– Nem pensar – replicou Josh, a franzir o sobrolho. – Já sabes que não é homossexual. Ambos o vimos com mulheres.

Mick esteve prestes a cuspir o café sobre a mesa. Zach desatou a rir, o que fez com que várias das mulheres que havia no restaurante olhassem na sua direcção.

– Estás a fazer com que olhem outra vez, Josh – comentou Mick, a abanar a cabeça.

– Eu? Se não sou eu quem está a rir-se como um idiota!

– Não tens que te rir – disse Zach, – para ser um idiota. O que queria dizer – acrescentou, como se estivesse a falar com um atrasado mental, – é que talvez Mick não procure uma mulher com seios muito grandes. Talvez seja porque isso que, segundo tu, é a coisa mais importante de uma mulher, não significa o mesmo para nós.

– Isso é verdade? – perguntou Josh a Mick.

– Que tens umas ideias muito estranhas sobre as mulheres? Sim – respondeu ele.

– O que queria dizer é se… se essa mulher é algo carente da cintura para cima – disse Josh, bastante contido.

– Pelo que sei – replicou Mick, que se sentia um pouco zangado, embora não soubesse porquê, – não carece de nada.

Aquilo surpreendeu ainda mais Josh.

Mick voltou a olhar pela janela. Para sua surpresa, viu que ela dava a volta à esquina, atravessava a rua e corria de novo na sua direcção. Os seus seios eram tão firmes como o rabo. Ao chegar diante do restaurante, diminuiu a velocidade e acabou por parar. Apoiou as mãos nos joelhos enquanto respirava profundamente, sem se precaver da chuva nem da atenção ávida com que Mick a observava.

Quando se ergueu, esticou os braços. A t-shirt levantou-se, mostrando um ventre que, sem dúvida, encantaria Zach. Cativado, Mick não parava de olhar para ela, enquanto o calor se apropriava dele lentamente. A jovem entrou na joalharia que havia justamente em frente ao restaurante, o que fez com que Mick se decidisse.

Afastou o prato para o lado e levantou-se. Nas últimas semanas, considerara muitas vezes a possibilidade de meter conversa com ela e apresentar-se. Não queria pressioná-la, mas tinha sonhado com ela duas vezes, portanto sabia que o fascínio que sentia por ela não ia desaparecer. Aquele momento parecia tão bom como qualquer outro para dar o primeiro passo.

– Regressarei em seguida.

Josh e Zach ficaram a olhar para ele fixamente. Mick tinha consciência de que a urgência lhe vibrava no sangue. Tinha sido assim desde a primeira vez que a tinha visto. Não sabia o que o atraía tanto nela. Só sabia que a desejava. E muito.

Enquanto se esquivava dos carros e das poças da rua, perguntou-se, pela centésima vez, se vivia naquela zona há muito tempo ou se acabava de se mudar na primeira vez que a vira. Nos últimos dois meses, trabalhara muito, às vezes dezassete horas por dia, por isso era provável que estivesse ali há algumas semanas.

Havia a possibilidade de lhe atribuírem outra missão a qualquer momento, portanto tinha que aproveitar a oportunidade que se lhe oferecia.

Esperava que fosse solteira. Sempre que a vira, estudara-a minuciosamente e não vira qualquer aliança no seu dedo. No entanto, sabia que muitas mulheres não usavam aliança, especialmente quando saíam para praticar desporto. Além disso, não a vira com ninguém ao longo daquelas semanas, mas isso também podia ser um acaso.

Subiu a gola do impermeável e atravessou rapidamente o passeio, a tentar manter-se tão seco quanto possível. Não tinha que olhar para o restaurante para saber que tanto Josh como Zach estavam a espiá-lo. Não era próprio dele perseguir uma mulher.

Justamente quando entrava pela porta da joalharia, começou a trovejar. O ar condicionado da loja fez com que a sua pele ficasse muito fria. Pôs o cabelo para trás e olhou em redor. Havia vitrinas por toda a parte, mas, por fim, viu-a no canto mais afastado da loja. Vestida com aquela roupa, destoava muito do ambiente elegante da joalharia. No entanto, também estava tão sensual, com a pele húmida pela chuva, as faces coradas pelo esforço e o cabelo molhado a escapar da trança…

«Maldita seja», pensou, zangado consigo mesmo. Não era assim tão bonita. De facto, era uma mulher bastante comum. Não tinha maquilhagem, mas as suas pestanas e as suas sobrancelhas eram tão escuras como o seu cabelo. Tinha as unhas curtas e limpas e um bom corpo, forte e esbelto, mas que não era verdadeiramente provocador nem sexy. Não era o tipo de corpo que o fizesse suar só de o ver.

Lembrou-se que ela nunca tinha prestado muita atenção aos homens. De repente, um pensamento terrível apropriou-se dele. Talvez nem sequer gostasse de homens. Aquilo seria um duro golpe, sobretudo quando sentia que precisava tanto de a possuir como de dormir ou comer.

Ela não parecia estar interessada em nenhuma jóia em particular. Observava uma vitrina, abanava a cabeça e ia olhar para a seguinte. Durante um momento, Mick sentiu-se satisfeito só de a observar. Meteu as mãos nos bolsos, mas tirou-as em seguida quando se deu conta de que aquela posição poderia deixar a descoberto a pistola que levava nas costas, guardada num coldre. Como estava fora de serviço, não necessitava da pistola, mas trazia-a sempre consigo.

O seu disfarce não seria credível sem ela. Traficantes de drogas, prostitutas, jogadores… Todos esperavam que um homem como Mick andasse armado. Se não andasse, consideravam-no um idiota, ou algo muito pior.

Normalmente, quando a situação não requeria uma arma, conseguia meter a sua Smith & Wesson de nove milímetros no coldre. No entanto, havia vezes em que tinha que andar sem pistola, o que o fazia sentir-se nu. Era nesses momentos que se sentia mais nervoso, quando a adrenalina praticamente o cegava. Depois, desejava sempre uma mulher, um modo de gastar toda a energia contida.

Naquele momento, também desejava uma mulher. Desejava-a a ela.

Aproximou-se um pouco mais, sem deixar de a observar. Surpreendia-o que ela não sentisse a atenção que lhe prestava, mas ela não era polícia e Mick tinha notado desde o primeiro dia que prestava muito pouca atenção ao que a rodeava. Surpreendia-o que as pessoas pudessem sobreviver com tão pouca cautela.

De repente, a porta bateu atrás de si. Entraram dois homens, vestidos mais ou menos como Mick, com calças de ganga e t-shirts. Um deles levava um boné de basebol. Pareciam ter uns trinta anos. Sendo polícia, Mick examinava automaticamente tudo e todos. De facto, reparara que na loja havia dois vendedores e um casal de certa idade que estava a ver anéis para um aniversário.

Talvez precisamente por ser polícia, detectou imediatamente a mudança que se produziu no ambiente com a entrada daqueles dois homens. Tinha um sexto sentido no qual confiava plenamente e não gostava do que este estava a sugerir-lhe.

A mulher levantou a cabeça brevemente e olhou para os homens que acabavam de entrar. Em seguida, olhou para Mick. Os seus olhares cruzaram-se por um instante, um momento que fez com que o corpo de Mick se retesasse de desejo. Antes de se virar para uma nova vitrina, dedicou-lhe um sorriso que aumentou ainda mais a tensão que sentia.

Com os sentidos alerta, Mick aproximou-se dela, mas não muito, para que não fosse demasiado evidente. Como a loja era pequena e estava cheia de vitrinas, pôde detectar o seu aroma. Era terrestre, quente… Cheirava a pele molhada e a suor feminino. O coração começou a bater-lhe ainda mais forte. O seu sexo levantou-se. Estava há demasiado tempo sem uma mulher, demasiado tempo sem gozar dos prazeres do sexo…

Os ténis que ela levava chiaram contra o chão. Não só parecia estudar as vitrinas, mas também a estrutura da loja. Mick franziu o sobrolho. Sentia-se um pouco intrigado. Então, de soslaio, observou que um dos homens metia a mão no bolso do casaco. Um alarme silencioso saltou dentro da cabeça de Mick.

Voltou-se rapidamente, mas não o suficiente.

– Todos quietos e calados! – gritou um dos homens, a agitar uma pistola com intenções ameaçadoras. – Que ninguém faça uma estupidez, senão terei que disparar!

«Maldita seja». Mick olhou em seu redor. A mulher idosa, que se agarrava com força ao seu marido, parecia estar prestes a desmaiar. As vendedoras estavam imóveis, horrorizadas. Com um movimento quase imperceptível, aproximou-se da mulher que tinha seguido. Ela olhava fixamente para o assaltante. Mais do que medo, parecia sentir fascínio pelo que estava a ver.

– Faremos o que viemos fazer – disse o assaltante que levava um boné de basebol, – e sairemos sem que ninguém seja ferido.

Mick não acreditou. As palavras soavam demasiado ocas, demasiado ensaiadas. Além disso, o homem tinha uma expressão de antecipação no rosto.

O outro homem apontou a pistola a uma das vendedoras.

– Tu! Abre a caixa registadora. Rápido!

A mulher hesitou, mais pela surpresa que por querer rebelar-se. Mick sentiu algo parecido. Estavam rodeados de diamantes e de ouro de muito valor, mas aquele idiota só queria o pouco dinheiro que pudesse haver na caixa registadora. Certamente o ladrão sabia que a maioria das vendas se realizava com cartão de crédito ou cheque. Aquela exigência não fazia sentido.

Mick ansiava poder empunhar a sua pistola. Desejava controlar a situação. Naquele momento, isso significava manter toda a gente viva, manter a «sua» mulher viva. Por isso, permaneceu imóvel.

Sem aviso prévio, o homem que tinha dado a ordem começou a gritar:

– Agora, maldita seja!

Toda a gente se sobressaltou. A vendedora esteve prestes a cair ao chão na pressa de obedecer. A idosa chorava em silêncio e a outra vendedora estava muito pálida. A primeira vendedora tentava abrir a caixa registadora, coisa que estava a custar-lhe sobremaneira. Antes que conseguisse abri-la, as sirenes da polícia romperam o silêncio que reinava na loja. Os dois assaltantes começaram a praguejar em voz alta, o que fez com que Mick se retesasse, esperando que saíssem a correr ou que decidissem vingar-se disparando sobre a vendedora. Na sua experiência, tinha aprendido que as coisas mais absurdas se produziam nesse momento, causando, com frequência, mortes sem razão. Preparou-se para reagir.

No entanto, o que os dois homens fizeram surpreendeu-o muito. Nem gritaram nem se puseram a correr, mas transformaram a jovem que estava ao lado de Mick no alvo da sua raiva.

– Bruxa! – rugiu o que levava o boné de basebol. – Fizeste soar o alarme…

– Não – sussurrou ela, dando dois passos atrás. Aquela era a primeira vez que Mick escutava a sua voz, e notou que vibrava de medo e assombro. – Nem sequer sei onde…

O homem apontou-lhe a arma sem pensar duas vezes. Então, Mick meteu-se no meio, o que surpreendeu muito os dois assaltantes. Ele sentiu as mãos da mulher contra as costas, agarrando-se ao casaco que levava vestido. Sentiu que o rosto da jovem se apertava contra o seu ombro e notou que tinha a respiração muito acelerada e que tremia. Estava cheia de medo, coisa que o enfureceu profundamente.

– Esta mulher é uma cliente. Não sabe onde está o alarme.

Os dois homens não lhe fizeram caso.

– Toda a gente no chão! – gritou o que levava o boné de basebol.

Justamente naquele momento, um carro parou diante da joalharia. Clientes e empregadas atiraram-se ao chão rapidamente. Mick acomodou-se mais lentamente. Não parava de pensar em como poderia ganhar um pouco de tempo. Se pudesse chegar à sua pistola… Com o cotovelo tocava no pulso da mulher. Assim como todos os outros, ela deitara-se no chão e tapara a cabeça com as mãos.

O ruído que os assaltantes produziram ao partir as vitrinas fez com que a idosa começasse a gritar e a empregada, a soluçar. A mulher que estava ao lado de Mick não emitiu qualquer som. Ele queria olhar para ela, animá-la, mas não queria afastar os olhos das armas dos assaltantes. Os dois homens agarraram em algumas jóias, mas mais parecia que estavam a destruir a joalharia só pelo prazer de fazer mal.

Era o roubo mais patético e desorganizado que Mick tinha visto em toda a sua vida. Os dois assaltantes pareciam pegar no que tinham mais à mão, sem se concentrarem no que pudesse ser mais valioso. Finalmente, dirigiram-se para a porta. A tensão aumentou tanto que o ar pareceu carregar-se dela de tal forma que era impossível respirar. Então, o que levava o boné de basebol voltou-se para disparar.

Mick mexeu-se com muita rapidez. Colocou-se em cima da «sua» mulher, com os braços a cobrirem-lhe a cabeça e o seu corpo forte a tapá-la por completo. Embora fosse uma mulher alta, parecia ter os ossos muito delicados. Mick ocultava-a sem problemas, sobretudo porque estava completamente decidido a protegê-la.

Ao senti-lo em cima, ela esticou-se imediatamente e tentou levantar a cabeça.

– Não! O que está a fazer?

Com uma pancada forte, Mick obrigou-a a baixar a cabeça contra o chão. Então, sussurrou-lhe ao ouvido:

– Está quieta.

No entanto, ela agitou-se ainda com mais força, a tentar livrar-se dele. Certamente sentia-se confusa e assustada e não compreendia as intenções de Mick.

– Vai.. – começou a explicar ele. Logo em seguida, porém, isso tornou-se completamente desnecessário.

O som do tiro cortou o silêncio. A dor repentina que Mick sentiu no ombro foi como uma labareda de fogo. Durante um momento, estreitou-a com força entre os seus braços, cerrando os dentes…

– Oh, Deus… – sussurrou ela, a tentar virar-se para ele.

Mick resmungou, mas não se mexeu. Por alguma razão, queriam-na morta. Contudo, para a matarem teriam que atravessá-lo primeiro com as suas balas.

Sentiu sangue a escorrer pelas costas. Era muito consciente da mulher que tinha debaixo dele, a chorar. No entanto, enquanto não ouviu a porta a abrir-se, não se separou dela, tirando ao mesmo tempo a pistola. Pôs de parte a terrível dor que sentia e conseguiu disparar através do vidro da porta. Atingiu o homem que tinha tentado matar a mulher na coxa antes que se metesse no carro. Então, antes que pudesse entrar por completo, o automóvel arrancou a toda a velocidade. O homem caiu ao chão e bateu com a cabeça no lancil do passeio. Ficou ali, deitado no chão, completamente inconsciente.

Mick levantou-se e saiu a correr pela porta. Viu o carro, apontou e voltou a disparar. A janela traseira desfez-se em pedacinhos, mas o carro não parou. Virou rapidamente numa esquina e desapareceu.

A rua encheu-se de curiosos. Mick sentiu que o braço se lhe punha primeiro, muito quente, depois, muito frio, e, por fim, deixou de o sentir.

Naquele momento, apareceram Zach e Josh. Tinham sido testemunhas do ataque do restaurante. Josh tirou a pistola a Mick e meteu-a no bolso das calças. Dois segundos depois, chegaram dois carros da polícia.

– Meu Deus, Mick! – sussurrou Josh, segurando-o. – Atingiram-te.

– Que alguém chame uma ambulância! – gritou Zach. – Este homem necessita de uma ambulância.

Aquilo fez com que Mick sorrisse, porque Zach era técnico de emergências médicas. Então, Zach abanou a cabeça e pegou no rádio para chamar ele mesmo a ambulância.

– Anda, senta-te – disse a Mick, e levou-o para o passeio.

– Não quero sentar-me num maldito lamaçal – resmungou ele. – Estou bem.

Só queria encontrar a mulher. Olhou em seu redor. Quando não a viu, sentiu que o terror se apoderava dele. Viu o casal de idosos e as duas vendedoras. Havia polícias por toda a parte. Dois carros-patrulha tinham ido atrás dos assaltantes. Um oficial dirigiu-se para o lugar onde estava Mick.

– O meu nome é Mick Dawson – disse ele, ao ver que o polícia o observava com o sobrolho franzido. – Sou da Judiciária.

Tentou tirar o crachá, mas o braço não parecia querer cooperar. Lançou uma maldição.

– Eu ajudo-te – disse Josh.

Rapidamente, o seu amigo tirou-lhe o crachá e mostrou-o ao polícia, que assentiu e gritou a outro que levasse uma manta. Cheio de frustração, Mick não pôde fazer mais nada senão permanecer ali, de pé. Sentia que se ia debilitando à medida que os minutos passavam. Enquanto isso, Zach dava instruções através do seu rádio e Josh empenhava-se em mantê-lo em pé.

– A ambulância está a caminho – informou Zach à polícia. – Sou técnico de emergências médicas. Eu ocupo-me dele até que chegue.

O oficial entregou-lhe a manta e foi para a rua.

Mick tentou soltar-se. Estava desesperado por encontrar a mulher. Então, viu-a ao lado do casal de idosos. O seu rosto, o seu belo rosto, reflectia uma profunda preocupação e incredulidade. Via-se-lhe um hematoma na face de quando a obrigara a colar a cara ao chão. Estava a tremer da cabeça aos pés.

Mick escapou de Josh para se dirigir a ela. Tinha que apertá-la entre os braços e pedir-lhe desculpas, embora não soubesse o seu nome nem por que aqueles delinquentes tinham querido matá-la.

– Maldição, Mick, vais cair – disse Zach.

Mick estava prestes a contradizê-lo quando sentiu que as pernas se lhe dobravam. Os olhos nublaram-se-lhe.

– Estás a perder muito sangue…

– Não deixes que se vá embora…

Mick queria faltar alto e claro para que ninguém pudesse desobedecer às suas palavras. No entanto, só pôde sussurrar, o que o enfureceu. Quando finalmente conseguia conhecê-la, mais ou menos, soava fraco, parecia fraco…

Lembrou-se de como se sentira bem ao tê-la debaixo de si durante aquele breve e intenso momento. Era absurdo, mas nem sequer quando tinha sentido o impacto da bala tinha deixado de pensar que estava em cima dela, que o rabo dela se moldava ao seu sexo, que a cabeça dela encaixava perfeitamente sob o seu queixo…

– Não deixes que se vá embora – repetiu.

– Quem? – perguntou-lhe Josh.

– A dos ténis… a do cabelo preto…

Josh olhou em seu redor.

– Já a vi, companheiro. Agora descansa. Eu ocupo-me de tudo.

Em seguida, Josh afastou-se do amigo e dirigiu-se a ela com um tom de voz que não admitia réplica:

– Menina, preciso de falar consigo, por favor…

Naquele momento, Mick perdeu a consciência.